Uma mistura de agenda com curiosidades,
histórias e trabalhos sobre espetáculos e pessoas que fazem o teatro acontecer
em Brasília.
E para abrir as portas segurando
o abacaxi, uma entrevista com Glauber Coradesqui. Professor, pesquisador e
produtor licenciado em Artes Cênicas pela Universidade de Brasília, lecionou na
Faculdade de Artes Dulcina de Moraes (2009-2012) e foi coordenador de pesquisa
e projetos da Fundação Athos Bulcão por 3 anos. Escreveu livro e fez cursos nas
áreas de Direção teatral e História da Arte em Londres, Inglaterra. Atualmente
com um novo livro sobre a história teatral brasiliense ele conta sobre sua
história e carreira no teatro.
Quem é Glauber Coradesqui por Glauber Coradesqui
Olha, o
Glauber é uma pessoa que decidiu fazer o que ele tinha vontade de fazer e foi
atrás disso. Acho que ele é uma pessoa obstinada, decidida, apesar de muitas
vezes não saber o que quer é alguém que não espera parado, que espera sempre em
ação. Inclusive falta tempo de respirar muitas vezes em várias decisões que eu
tomo. Eu estava falando da respiração e não tem nenhum elemento de ar no meu
mapa astral e isso me faz muita falta, às vezes eu sinto a necessidade de parar
e respirar antes de tomar certas decisões, de pensar em certas coisas. Mas ele
também é um menino do interior, que cresceu brincando com o pé descalço em
Minas Gerais e se mudou pra Brasília 20 anos atrás.
Eu sou uma pessoa que ainda não
desenvolvi um antídoto contra seres humanos. Então eu ainda acredito e desejo o
convívio com eles.
A vontade de fazer teatro
Eu não sei explicar exatamente de onde
veio. Eu sei que eu fui uma criança muito aficionada pela televisão e eu acho
que isso me colocou em contato com o universo da arte de alguma maneira. Acho
que foi por esse caminho que eu entrei. Mas desde que eu me entendo por gente
eu sei que eu gosto de arte e que eu tenho vontade de me expressar
artisticamente de algum jeito.
Ninguém da minha família é
artista, estuda arte e frequenta espaços de arte, culturais, apesar de que
quando eu era criança minhas tias desfilavam nas escolas de samba da cidade,
eram artesãs, uma bisavó minha era uma artesã super talentosa... Mas essa
relação mais formal com a arte, como a gente tem hoje, ninguém da minha família
tinha.
Ser arte educador
Eu adoro dar aula, aprendo muito dando
aula. Quando eu era criança também brincava de ser professor e era do que eu
mais brincava, eu acho. Pegava minha irmã e ela era minha aluna. Então eu tenho
essa vontade desde que eu era pequeno e depois que eu comecei a estudar vi que
essa é realmente a minha vocação.
Dou aula porque eu gosto, porque eu
acredito no momento da aula como um momento de formação, libertação,
conhecimento. eu acredito que especialmente ensinar arte é uma maneira de possibilitar
caminhos para que as pessoas se tornem mais autônomas diante do fenômeno
artístico e das experiências que elas venham a ter.
Os dois lados
Eu não sei se existe a diferença entre
o Glauber homem e o artista. Eles são a mesma pessoa. O que eu faço e vivo na
arte é o que eu faço e acredito na vida. Tento levar pra minha profissão as
mesmas coisas que eu levo pro meu dia a dia. Só acho que nas esferas
profissionais a gente faz certas concessões que muitas vezes a gente não faz
nas esferas pessoais.
Universidade e formação
Eu acredito que um artista que se forma
na universidade é bastante diferente do artista que se forma no dia a dia, na
escola técnica ou dentro de um grupo. Apesar de que a universidade nem sempre é
o primeiro contato do artista com o teatro. Muitas vezes ele vem de um grupo
amador, de alguma outra experiência do passado que ele vai tentar consolidar de
alguma maneira ali.
Eu penso que a universidade tem um
espaço muito grande pra experimentar e nesse sentido me parece que os artistas
que se formam em Brasília são artistas mais dispostos a experimentar, brincar
um pouco mais, a buscar outros caminhos para a criação artística que não os
caminhos mais consolidados, mais tradicionais. Agora é difícil dizer porque eu
também não tenho um contato tão aprofundado com os artistas de outras
cidades .
Eu vejo coisas em outras cidades e eu
percebo uma diferença entre o que a gente vê aqui. Acho que realmente Brasília
se joga um pouco mais na experimentação apesar da gente ainda ter um mercado
muito incerto, muito incipiente, de ter uma população que é pouco cúmplice da
produção que a gente faz.
Relação com a Fundação e Athos Bulcão
A fundação Athos Bulcão é uma grande
escola pra mim. É o lugar onde eu realmente me formei profissionalmente. Foi lá
que eu aprendi a fazer a maior parte das coisas que eu sei fazer no que diz
respeito ao desenvolvimento da minha profissão principalmente da parte de
gestão cultural, coordenação de projetos, arte educação. A outra parte eu
aprendi na universidade. Então eu tenho um apreço enorme por ela, uma
instituição muito séria que desenvolve projetos de enorme importância pra arte
de uma maneira geral. Quando você investe no ensino você
investe na arte. Eu acho que a fundação faz muito isso,
por exemplo, com o festival de teatro na escola que, eu não me canso de dizer,
é um dos maiores projetos de educação teatral do Brasil. Por isso que eu
acredito muito e eu serei eternamente ligado a ela, foi realmente a minha
grande escola, onde eu aprendi e pude fazer muitas coisas legais lá, que eu
pude contribuir bastante também pra dar pra fundação essa cara que ela tem
hoje. E quanto ao Athos Bulcão eu acho que ele é um desses fenômenos
condicionados pelo determinismo geográfico. A gente é uma cidade que está
distante do grande centro de produção, da academia que publica, do jornal que
circula pra pessoas mais influentes. Athos Bulcão é um artista de alcance
nacional talvez internacional. Ele tem uma qualidade de trabalho que com
certeza o destaca na história das artes visuais nacionalmente e acho que ele
não teve esse reconhecimento porque ele optou ficar em Brasília. Talvez se ele
tivesse participado de movimentos culturais no Rio de Janeiro e São Paulo ele
teria hoje um lugar de muito maior destaque na história das artes visuais do
que ele tem hoje. Mas eu acredito que muito conhecimento ainda será produzido a
partir o que ele criou.
Livro Teatro na Escola - Experiências e olhares (Editora Fundação Athos
Bulcão. Brasília. 2010)
Então, esse livro é um livro que a
gente fez com muito carinho porque ele registra a trajetória de 10 anos do
festival. Ele funciona de alguma maneira como uma sistematização daquilo que
foi produzido, gestado durante esses 10 primeiros anos que o projeto aconteceu
e também como uma matéria de exportação da metodologia do projeto.
O projeto tem uma metodologia própria
interessantíssima, uma contribuição pra história do teatro da cidade, também de
uma forma muito contundente e acho que esse livro serve muito pra isso. Tem
textos bastante sagazes e eu acho que são textos que também colocam o ensino do
teatro de uma maneira que outros não colocam. Nesse sentido ele não é só um
catálogo, um livro de registro, ele também é um livro de reflexão e que eu acho
que quando o descobrirem vão se dar conta de que ele é um material muito rico
pra pensar o ensino de teatro no Brasil especialmente na instância formal que
eu acho que é um dos maiores desafios do ensino de teatro atualmente. É como
ele pode acontecer dentro da escola e não fora como em projetos ou em ações
culturais que também são importantes mas que já estão mais resolvidos. Acho que
dentro da escola é o maior problema que a gente tem.
E foi a primeira oportunidade que eu
tive de exercitar esse olhar mais de autor, de organizador que é uma prática
pra qual eu tenho interesse de me dedicar um pouco mais a partir de agora.
Projetos atuais
Eu estou lançando o meu segundo livro
que se chama Canteiro de Obras: Nota sobre o teatro
candango que é um olhar sobre as obras teatrais
produzidas nesses primeiros 50 anos da cidade. Então é uma tentativa de
construir alguma reflexão teórica, poética, sobre esses trabalhos que foram
criados aqui em Brasília no intuito também de expandir em outros contextos o
que a gente produziu aqui que foi bastante interessante. Eu acho que a gente
tem obras que merecem o destaque na história do teatro nacional também por
encerrarem práticas muito interessantes, muito inaugurais algumas vezes, consistentes,
contundentes com o contexto, algumas pesquisas de linguagens super
interessantes que se deram só aqui pelo que a cidade proporcionou pros artistas,
pelo momento que a cidade aconteceu e pelo momento em que os artistas fazem o
teatro acontecer nela, então é uma história curiosa, muito rica e que é
importante que o Brasil conheça. Acho que esse é o meu projeto atual de maior
destaque.
E estou com uma pesquisa de mestrado
sobre a mediação de espetáculos contemporâneos, que é uma tentativa de pensar estratégias
pra aproximar o teatro que a gente faz do grande público. Se é que ele existe, quem é esse grande público? Mas a gente sabe que hoje a arte é distante. Se a gente for pensar em
classe social ela é muito distante. Então a mediação tem um papel social
importante de tentar diminuir essa lacuna que existe entre a arte que a gente
produz e a arte que se deseja consumir, acho que ela tenta inverter um pouco
esse jogo e tenta incluir mais pessoas no fenômeno artístico que a gente tem
produzido atualmente no teatro.
Viver no teatro
Eu não me vejo em outro lugar. Às vezes
paro pra pensar em outras coisas que eu poderia fazer, em coisas que eu queria
fazer e eu não vejo. Então é onde eu quero estar. Eu quero estar no teatro. Não
sei fazendo exatamente o que. É o que eu estou sempre buscando e eu acho que o
teatro é um campo que te oferece muitas possibilidades de lugares de atuação e
eu tenho transitado por algumas nesses 13 anos que eu faço teatro e eu quero
continuar transitando. Eu não me vejo desistindo.
Teatro em 1 palavra
Hm... Nossa que silêncio abismal, Abacaxi. Em uma palavra? Eu pensei em
várias palavras aqui, estou tentando escolher a melhor delas que com certeza
depois eu vou voltar e trocar. Uma palavra... Compartilhar.
Entrevista feita na quinta-feira, 31 de janeiro de 2013 no Centro Cultural Banco do Brasil em Brasília.
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